domingo, fevereiro 26, 2012

Doce sabor do acaso

Coma o que é concreto,
Vomite o que é céu
E esqueça o que foi seu.
Vamos revelar nenhum espírito
E rabiscar poemas de Shakespeare.

Onde estou que não encontro
O outro lado do que nunca fui?
Serei apenas esse corpo sem esquina
Com um jeito quase estranho de ruína.
O espelho é o retrato de uma ausência
Da cópia que é sempre mais bonita.

Respirei a sobra da gramática
No doce sabor do acaso.
E eu ainda não sabia
Quantos de mim cabiam num dia.

Leleco.

sexta-feira, fevereiro 24, 2012

Habeas Corpus

Era apenas a alma enforcada
Naquele morrer diferente
Onde o que mata é aquilo que não se sente.

O sono suspira seus delírios
Nas fagulhas da loucura.
Saliva febril de fósforo
Aquecendo lábios pálidos.

O volume do grito
Arranhando esqueletos enrugados
E engolindo o tédio e a neblina
Das paixões engorduradas.

Não serei o subúrbio de nenhum amor!

Leleco.

segunda-feira, fevereiro 13, 2012

Bruxaria

Agora que sou
Aquilo de ser o outro
Aprisionado em nenhum corpo
Algo me lembra de existir.

Um desejo bruxo da mistura
De amor faminto e abandono
Em verso vinho de um gosto vazio.

No fundo de todos os delírios
Invento a dúvida que me salva em dívida
E o sono que me agita
Assim que amanhece o dia.

Quem disse que não é feitiçaria?

Leleco.

sábado, fevereiro 11, 2012

Na casa de tijolo vermelho

A sede quase mata
Em águas que são vivas
E a ilusão do que há
Longe dela.

Esqueci de esquecer
Seu amor cor de jasmim
Disfarçando aquilo que se vive
Em pequenos goles de amanhã.

O vento sopra a saia
Enquanto afundo entre pernas.
Onde você foi desejo
À espera da meia-noite?

Eram minhas palavras de vídeo cassete
A desafiar outras respostas?
Na casa de tijolo vermelho
Despencavam exclamações de travesseiro.

Leleco. (Para Mariana)

quarta-feira, fevereiro 08, 2012

Binóculo

O amor não passa de violentas violetas
Em carnes perfumadas.
Noite pesada, nuvem com alma de chumbo
Acendendo chuvas quando dobram em mim.

Mona Lisa mal-assombrada
Florindo fumaça
Em retratos de botequim.

Entre os dedos
Disfarço um binóculo
E enxergo além do unicórnio
A constelação que guardei pra ti.

Volto a evaporar solidão
Em vazios que o vento sopra
Queimados de som
Muito além do seu jardim.

Leleco.

quarta-feira, fevereiro 01, 2012

Nada mais que nós mesmos

Apertei a alma entre os dedos
E costurei um céu com o pedaço
Que alguém roubou do Paraíso.
Por que Deus não veio
Antes de dinamitar seu desprezo?

Voltou o cheiro túmulo
Do amém tímido dos mortos
Em provérbios do inferno.
Nada mais que nós mesmos
Diante do olhar do espelho.

Apaguei a vela que era viva
E adiei o silêncio enganando palavras.
Antes do tempo triturar eternidades,
É preciso desafiar a própria vaidade!

Leleco.